Soube hoje que os três ex-elementos vivos dos Joy Division, os New Order, estarão a encarar seriamente voltar a gravar sob aquela denominação para a banda sonora do filme sobre o falecido (em 18 maio 1980) cantor Ian Curtis. Ao que consta terão tocado recentemente ao vivo temas da antiga banda e encaram a hipótese de criar novas músicas como Joy Division.
Não sei...isto de desenterrar velhas glórias, ainda por cima faltando um elemento da formação original, deixa-me sempre de pé atrás. Veja-se o caso dos Doors com o vocalista dos Cult a imitar os gestos e imagem do Morrison...que falta de chá!
No entanto, também acontece a coisa resultar. Os Velvet Underground voltaram aqui há uns anos e, apesar de nada acrescentarem, não fizeram figura ridícula. Os Love também se limitaram a recriar a obra-prima "Forever Changes" de 1967 e não desiludiram, pelo menos na digressão pela Grã-Bretanha, porque aqui no Sudoeste o mentor e fundador Arthur Lee deixou o resto dos músicos pendurados e não apareceu. Os Stooges reapareceram com força, por culpa da energia do velho-jovem Iggy Pop. Agora os Gang of Four também têm novo disco que não os envergonha de forma alguma. Ele há casos e casos...
Depois há aqueles que nunca pararam completamente como o Dylan, Springsteen, Young, Cohen, Reed, Cave, P.Smith, que vão dando sinais de vida de tempos a tempos, uns mantendo o bom nível, outros oscilando entre o bom e o mau.
Também acontece estes regressos terem razões de carteira, a malta anda ali pelos 50 anos, a criatividade escasseia, não produz novos êxitos, há contas para pagar, a editora quer ver se ganha mais algum, e lá se faz um novo disco ou reeditam-se obras importantes com novo embrulho, faixas extras, take 28 da canção x, junta-se um dvd manhoso com imagens de backstage sem qualquer interesse, um remix pelo dj ya man, etc...
Mas voltando aos Joy Division e ao filme sobre o Curtis, espero de todo que aquilo não resulte em nada de foleiro- tipo santificação de um artista que se enforcou aos 23 anos porque Deus leva os jovens génios para junto de si. Aquele tipo de glorificação cliché sex & drugs & rock ´n roll que, no caso, não se ajusta de todo.
Pelo que li sobre o filme que se prepara, baseia-se no livro escrito pela viúva Deborah Curtis denominado "Touching from a distance", cuja edição portuguesa tem o título de "Carícias Distantes" (Assírio & Alvim-1996). No livro a ex-companheira exorciza a culpa, a perda, a confusão, a incompreensão que pautou a vida do casal, a incapacidade de harmonizar a sua relação familiar com as exigências da vida de cantor e o drama de Curtis pelo agravar da sua doença-epilepsia- que, para além dos mais próximos, ninguém parecia dar a devida atenção. No fundo o livro faz a desconstrução de um mito tornado objecto de culto pela aura que se criou devido ao seu suicídio, às suas letras enigmáticas e negras, e à sonoridade claustrofóbica das músicas. Fala de um gajo de carne e osso que faz as coisas normais como qualquer outra pessoa, mas alguém que também oscilava entre a alegria, a ternura, a paixão, o amor e as crises da doença, o mal estar, a fuga, a infidelidade, a mentira e a crueldade da relação...
Porque a música dos Joy Division muito me acompanhou e ajudou a ser aquilo que sou, para o bem e para o mal, faço figas para que este antes improvável regresso se faça com um mínimo de dignidade e respeito. Até me dá arrepios...!
sexta-feira, dezembro 16, 2005
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