quinta-feira, outubro 27, 2005

Rosma, Texas (Continuação)

O Abel reuniu uma matilha de bandidos do pior que se poderia imaginar: Os Calabois, o Cassapo, o Paneta, o Miau, o Vaquinhas, o Tó Pingaroto, o Carlos Caguíta e os Pecados (Sérgio e Quim). Passavam os dias no café do Zé do Leite, que era também o motorista da Rodoviária e deixava a mulher e o filho a tomar conta do estabelecimento durante o dia. Este sítio era o centro da malta nova naquela época (ainda hoje existe, mas perdeu importância) e até organizava bailes no piso de cima. Bebiam-se uns copos na esplanada, jogava-se aos matraquilhos, ao snooker e ia-se até à capela de S.Roque para se fumar qualquer coisa, tocar umas guitarradas, ouvir os UHF e os Pink Floyd num gravador portátil e voltava-se ao café...era um constante ir e vir. Os que tinham mota faziam as suas exibições e recebiam aplausos e vivas, os outros curtiam na mesma, cada um à sua maneira.

O Zé do Leite fartava-se de facturar e certa vez fez lá um baile da vassoura. Este baile consistia em que um gajo tem uma vasoura na mão enquanto os pares de sexo oposto vão dançando, depois tem que entregar a vassoura a outro gajo e ficar ele a dançar com a miúda. Quando acabava a música aquele que estivesse com a vassoura pagava uma rodada à malta.
Estava o Carlos Caguíta a dançar com a Marimôlha, que era irmã do Vaquinhas, e a música "Je t´aime mois non plus", introduzida no Texas por um emigrante franciú, tinha qualquer coisa que dava logo umas vontades do caraças de ir para trás da Igreja arrenfinfar numa gaja. O Caguíta começou a alambazar-se com a Marimôlha e ela, como era uma rebarbada feia e malcheirosa que morava no campo e só vinha à terra ao fim de semana, estava a gostar da cena. Era piropos ao ouvido, sorrisos marotos, mãos deslizantes e assim...
O Vaquinhas e o Abel aparecem no baile com uma cadela nos cornos que mal se tinham em pé, de cervejas numa mão e cigarro noutra, troncos nus e blusões de ganga sem mangas a dizer Hell´s Angels atrás e umas trunfas até meio das costas que se viu logo que aquilo ia dar espiga. Para mais estavam a abusar da irmã do Vaquinhas. Então, o Abel tira a vassoura das mãos do Joaquim Caixote e vai entregá-la ao Carlos Caguíta para assim acabar com a cena que já envolvia linguados e tudo. O Carlos começa a discutir com o Abel, de repente a música é interrompida e vê-se o Vaquinhas com a coluna de som na mão e atira com ela à cabeça do Joaquim Caixote que tinha aproveitado a deixa e dançava agora com a Marimôlha. Este ao ver o sangue a escorrer-lhe pela cara pega numa grade de cervejas vazias e acerta com ela no Vaquinhas que cai no chão. Gera-se uma grande confusão, vêm dois GNRs que estavam de serviço e bebiam umas minis no piso de baixo, acabam com o baile e levam o Caixote e o Vaquinhas ao posto para interrogatório.

Entretanto a cena acalma e a malta dispersa. Mais tarde, já dispensado pela GNR o Vaquinhas vai ter com o Abel e este vai a casa buscar a caçadeira, dirigem-se a casa do Carlos Caguíta, que tinha o seu quarto no piso de cima e exigiam que este aparecesse à janela para falarem com ele. Mas ele nada, não havia meio de aparecer. Fartando-se de lhe chamar nomes insultuosos, o Abel prega com dois cartuxos na janela que arrebentaram com os vidros, de seguida abre-se a porta da casa e quem se mostra é o Ti Artur, o pai do Carlos que não estava lá porque tinha fugido com medo para a serra e viria a aparecer uns dias mais tarde e com a condição de pagar uma grade de cervejas. Ora o Ti Artur só não andava bebado quando estava a trabalhar no campo a guardar ovelhas e, estando em casa, tinha uma camada que não dizia coisa com coisa. A malta deu de sola, mas o homem ficou com uma fúria tremenda que pegou na caçadeira deu três tiros para o ar e rebentou com um cabo de electricidade daqueles grossos que a aldeia ficou dois dias sem luz. Acabou também por ir ao posto abrir ficha.

Foi o último baile da vassoura que se fez no café do Zé do Leite e desde aquela altura limitou-se a ser apenas um simples café com uma salinha de jogos e pouco mais. Mas a aldeia começou a ficar conhecida por Texas, devido às coboiadas e terror que o grupo do Abel protagonizava e até apagaram o verdadeiro nome da placa que estava à entrada da localidade e escrevam em grandes letras pretas "Texas".

Mais tarde, já nos anos 90 a mesma aldeia viria a ser conhecida por Kuwait, mas isso é uma outra história.

4 comentários:

blimunda disse...

a última festa da vassoura a que fui foi há 3 ou 4 anos e por acaso até foi na minha casa de alfama. éramos 10 em 15 metros quadrados! e com sofás e mesas á mistura. e não houve nem linguados nem porrada. que estranho. eu continuo a achar que os ares que se respiram por esses lados beirões fazem com que o pessoal fique um bocado estranho da marmita. é que as minhas 4 costelas são todas dessas bandas também. estão divididas entre as aldeias de vilar do boi, vale da bezerra e peroledo. só os nomes... nas festas havia sempre um bêbado que acaba por morrer afogado num poço... e isso era o mais light que acontecia...

pinhacolada disse...

Lá também houve bêbados afogados em poços, até houve um que fui eu que encontrei a boiar lá no fundo inchado como caraças! ainda tenho a imagem na cabeça.
Aquele pessoal era e é estranho poque é uma zona muito isolada, que agora é reserva do tejo internacional e não sei quantos...até os javalis iam ao café pá!!

blimunda disse...

iá! eu lembro-me de uma vez no tempo da azeitona de ir com o meu avô em cima de uma burro e ver ao longe um javali. ainda por cima a minha avó que sempre foi uma senhora muito sensível andava sempre a assustar-me com lobos. já para não falar das cobritas que andavam por lá no verão... chiça!!! comparadas com as bestas do alto do seixalinho ...

pinhacolada disse...

Bem de cobras nem quero falar...certa vez apareceu uma na cozinha da minha avó que eu estive uma semana sem lá entrar com o medo que tinha!